sexta-feira, 15 de abril de 2011

O OITAVO DIA DA CRIAÇÃO

A Direção de O Faniquito pede permissão ao querido amigo e colega Nelson Cadena para reproduzir na íntegra seu artigo publicado na edição de hoje do Correio*

Nelson Cadena: O oitavo dia da criação

15.04.2011 | Atualizado em 15.04.2011 - 08:54
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Há um vácuo no Gênesis que descreve a história da criação por Deus. “E, havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito”. A questão é por que Deus teria descansado no sétimo dia? Imagino que para repor as energias e concluir o que idealizara; preparava-se para um grande desafio, o maior de todos. No dia seguinte, Deus tinha de criar alguma coisa que confirmasse a qualidade de tudo que criara até porque, segundo sua intenção, deveria permanecer para toda a eternidade. E, então, no oitavo dia, Deus imaginou um teste-drive para sua obra e criou o filho da puta.

Esse elemento que o livro do Gênesis prefere omitir, o filho da puta, foi a mais racional criação de Deus. Ele veio para testar, com o seu espírito de porco e atitude predadora, a luz que Deus fez  no primeiro dia da criação. “E viu Deus que era boa luz e fez a separação entre a luz e as trevas.  E Deus chamou a luz dia e as trevas noite”. E, então, o filho da puta jogou bombas em Hiroshima e Nagasaki que desfizeram a luz e tornaram tudo trevas, mas nem com toda a eficiência da energia suja liberada conseguiu reverter a obra original de Deus. 

O filho da puta também pôs a teste a obra de Deus no segundo e terceiro dias quando criou as águas e a porção seca que chamou de terra “e disse Deus: produza a terra erva verde, erva que dê semente, árvore frutífera que dê fruto segundo a sua espécie, cuja semente está nela sobre a terra; e assim foi”. O dito cujo esforçou-se e ainda se esforça em destruir as árvores com tratores e motosserras e em destruir as sementes com agrotóxicos e em alterar as espécies com mutações de laboratório. E mesmo com a sua perseverança na degradação da terra e de seus frutos que provocaram o desequilíbrio (vieram os gafanhotos, as pragas e as formigas e pelo ar veio a chuva ácida), nem assim a obra do segundo e terceiro dias do criador foi consumida.

O filho da puta veio também para testar as obras do quarto e quinto dias do criador. Privando os animais da liberdade em gaiolas e jaulas, expondo-os tristes e maltratados em circos e caçando-os pelas matas, rios e savanas do planeta para exibi-los em forma de tapetes, bolsas, sapatos, echarpes, casacos, adereços ou pendurados em salas e salões, empalhados, ou dissecados. Nem assim a obra de Deus foi exterminada e, se algumas espécies desapareceram, créditos para o filho da puta, que venceu apenas uma batalha, mas não a guerra.

Retomando o texto bíblico, no sexto dia: “Criou Deus o homem à sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou”. No oitavo dia, nessa o Gênesis se passou, Deus criou o filho da puta para testar também a raça desses primeiros exemplares que chamou de Adão e Eva. O dito cujo se superou escravizando os seus semelhantes e fazendo uso de seu corpo sem o seu consentimento e ainda exterminando milhares desses espécimes com a espada, mais tarde com fuzis e baionetas, supostamente para ampliar territórios, em nome do poder, mas também em nome de Deus, em cruzadas sangrentas. E um dia exterminando milhões deles em campos de concentração e câmaras de gás, a pretexto de renovar a raça original e, mesmo com toda essa eficiência do filho da puta, nem assim Adão e Eva, a melhor criação de Deus, deixaram de existir.

E no nono dia, essa também o Gênesis omitiu, Deus se preparava para, de fato, descansar, quando um insigth o fez reconsiderar a sua intenção: “Melhor ficar de olho nesse filho de puta, vai que ele consegue mesmo acabar com a minha obra”.

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